Quando fui gerado, cresci numa bolsa, dentro de minha mãe. Nós dois construímos um cordão que nos ligava. Eu não percebia que este espaço era tão pequeno; tinha a impressão, no início, de que o universo era só meu.
Conforme fui crescendo, fui sentindo os limites. Quando me mexia, minha mãe logo percebia. A minha vontade era a de tomar conta de todo o seu corpo, mas eu não podia porque eu não era ela; eu era um ser distinto, para o qual foi reservado somente aquela bolsa.
Quando nasci, este espaço aumentou. Confesso que me senti um pouco perdido e comecei a chorar. Embora eu tivesse muito mais que uma bolsa para estar, surgiu o primeiro grande limite deste espação: eu teria de, naquele minuto, aprender a respirar. Por isto chorei. Chorando, meus pulmões começavam a aprender como teriam que fazer para deixar o ar entrar. Minha mãe agora não respirava mais por mim. Que saudade daquela bolsa!
Esta saudade não durou muito, pois logo o espação passou a ser delimitado. Puseram-me no colo, num berço, dentro de roupas, e comecei a me sentir mais seguro.
Dali a pouco, percebi que minha mãe não se alimentava mais por nós dois, e novamente coloquei o “chorador” para funcionar, pois o meu corpo me avisava que eu precisava me virar. A partir daí vieram os horários, e eu comecei a aprender que nem tudo é como a gente quer, na hora que se quer e na quantidade que se quer.
Fui crescendo, mesmo com todos estes limites, e continuei achando que o espaço grande e eu éramos a mesma coisa. Então, fui aprendendo a resistir às limitações que a vida começava a me ensinar: não queria comer na hora de comer; queria comer somente os doces; não queria tomar banho; não deixava cortarem minhas unhas; queria o brinquedo maior, mais colorido e, se desse, um monte deste brinquedo de uma só vez.
Tinha a sensação de que eu controlava tudo. Meus pais, no entanto, não deixavam o controle na minha mão. Isto deu um certo alívio. Conheço um amiguinho que ficava com o controle e sofria muito, pois seu espação foi ficando cada vez maior, e ele tinha tudo o que queria, mas tinha um baita medo de, tão pequenininho, não dar conta daquela imensidão.
Eu chorava quando os meus pais me ensinavam mas, como lá no meu bercinho, o choro me ajudava a entender mais um pouquinho desta vida.
Créditos:Laura Monte Serrat Barbosa
Texto publicado no Boletim da Associação Brasileira de Psicopedagogia, Seção Curitiba, abril/maio 2000, e no livro A Psicopedagogia no âmbito da instituição escolar, da autora, em 2001.
Pedagoga, psicopedagoga, especialista em Psicologia Escolar e da Aprendizagem, mestra em Educação.
Fonte:http://www.monteserrataprendizagem.com.br
Um comentário:
Simplismente este texto é tocante...é lindoo!!! Nossa trajetória começa na barriga da mamãe
tudo ali era tão fácil...mas um dia temos que caminhar por nossas próprias pernas...ah..isto é doloroso demais!!! Mas só assim aprendemos que o mundo não gira em torno de nós , existe o outro!!
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